segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO- Algumas momentos

Saí, hoje (26/01) pela manhã, com destino a Universidade Federal Rural da Amazônia-UFRA, localizada na Av. Tancredo Neves (antiga Perimetral). Ia confirmar minha inscrição no Fórum Social Mundial. A UFRA fica na periferia de Belém, no pobre e violento da Terra Firme (o nome atual é Bairro Montese, mas todo mundo continua usando o antigo), onde também se localiza a Universidade Federal do Pará e uma parte do Museu Goeldi.
Depois da recapagem e melhorias implementadas pelo governo, como limpeza dos canteiros, melhor sinalização e iluminação, câmeras de vigilância, foi a primeira vez que trafegava por ela. A estrada está em excelentes condições, mas o trânsito estava bem congestionado na porta da UFRA, com vários agentes de Trânsito (CTBEL) e guardas municipais orientando os fluxo de carros e ônibus. Vi diversas barracões armados e uma dúzia de ônibus estacionados no interior do campus. Por todo lado centenas de jovens se movimentavam com suas mochilas e roupas coloridas. A cena me lembrou uma revoada de borboletas que vi certa vez na estrada Belém - Bragança.
Dentro do ginásio da UFRA o atendimento foi bem rápido e saí de lá devidamente encrachatado, com a sacola do evento a tiracolo. Meu destino: o Hangar, Centro de Convenções e Feiras da Amazônia, onde acontecia a abertura do Fórum Mundial de Educação. Também me inscrevi no Fórum Mundial de Mídias Livres, que a princípio fora previsto também para o Hangar, mas chegando lá soube que havia mudado para a Escola de Aplicação da UFPA (antigo NPI), também na Av. Perimetral. Diante da impossibilidade física de estar em dois locais ao mesmo tempo, e como estava muito interessado na conferência “Educação, Transgressão e Construção da Cidadania Planetária”, proferida pelos mestres Moacir Gadotti, Leonardo Boff e pela senadora Marina Silva, optei por deixar o FMML pra depois. Abaixo alguns momentos da conferência de abertura.

MOACIR GADOTTI
Gadotti iniciou a conferência falando de esperança: “vivemos em esperança”, disse. E continuou: “Aqui não estamos para trazer respostas, pacotes, estamos para celebrar, para entender juntos (...). Viemos aqui para aprender”. Para introduzir o tema da conferencia, Gadotti utlizou-se da logo do Fórum (vide imagem), dizendo que ela mesma já representava uma transgressão, pois “aprendemos a ver o mundo a partir da visão do Norte e a imagem apresenta o mundo a partir da visão do Sul”.
Sua fala discorreu sobre uma proposta de “Pedagogia da Transgressão”, de uma “Cidadania Ambiental como parte fundamental da Cidadania Global”, e recordando que no ano passado completamos 40 anos da Pedagogia do Oprimido, deixou claro que é pela educação, conforme pregava Paulo Freire, que um outro mundo é possível. E encerrou citando um trecho de um poema do amazônida Thiago de Mello, em que indaga “Que lição pode nos dar o rio Amazonas?”
LEONARDO BOFF
O teólogo iniciou expressando sua grande admiração pela senadora Marina Silva. E em dado momento disse: “Marina Silva seria a governadora do mundo, mas nos contentamos que ela seja a governadora do Brasil”. Os aplausos de todos na platéia mostraram que isso era uma unanimidade entre os presentes.
Boff falou de desafios da sociedade planetária, dizendo que não gosta da expressão ‘globalização’, preferindo ‘mundialização’, que acha mais apropriada. E falou que somos todos africanos, porque a espécie humana nasceu na África. Disse que a civilização planetária vive uma série de crises, e “em último termo a Terra poderá continuar, mas poderá continuar sem nos, os seres humanos”. Para ele é necessário que o ser humano conserve o capital natural e distribua os benefícios com toda a humanidade.
Segundo Boff, o que o mundo precisa é de cuidado. “O cuidado é o gesto amoroso com a realidade. O cuidado regenera os estragos que temos feito, o cuidado previne estragos futuros. Se nossas mães não tivessem o cuidado em nos acolher nos não estaríamos aqui.” Para ele é a atual forma de economia de mercado, com a exploração de todos por poucos, a principal responsável pelo agravamento da crise mundial.
Falando das previsões de analistas com relação ao futuro da Terra, Leonardo Boff afirmou que “a partir de 2030 começa a desolação total” e fez um veemente apelo para que cuidemos do planeta, e disse que somente pela solidariedade e cooperação poderemos superar os problemas criados pela acumulação mundial. Apontou “5 princípios que vão sustentar o novo ensaio civilizatório” e as 4 virtudes fundamentais, que são:
1-Hospitalidade (como direito e dever de todos). Esse conceito, explicou, é de Emanuel Kant ao propor sua idéia de uma república mundial.
2-Convivência. “Nós não vivemos, nos convivemos”, disse ele. E acrescentou que “conviver com o outro e aceitar as diferenças não é tão fácil. Mas é importante não deixar que a diferença decaia para a desiguladade”.
3-Tolerância – Para Boff “há uma falta mundial de tolerância. Tem gente que diz: a minha verdade é a única... Daí vem as guerras e os conflitos.”
4-Comensalidade – Boff esclareceu que comensalidade era uma prática do Cristo, e significa sentar juntos e desfrutar da generosidade da terra. Sentar em torno da mesa e partilhar irmanamente dos frutos da terra é um sonho presente em toda história. Reforçou o sagrado direito de todo ser humano se alimentar com dignidade, e elogiou o Fome Zero e a política do Presidente Lula nesse sentido.
Para finalizar, Leonardo Boff deixou palavras de esperança quando disse que “o cenário não é de tragédia, é de crise. Essa crise nos vai mostrar que podemos viver melhor e mais com menos”. Com menos devastação da natureza, com menos violência, com menos ambição e busca pelo prazer e acumulação desenfreada, com menos sofrimento. E uma de suas frases tocou fundo na platéia: “O terrível do sofrimento não é o sofrimento, é o abandono no sofrimento”.
Para ele a crise é uma chance de repensarmos o que temos feito com nosso planeta, “mas a crise não se transformará numa tragédia. Isso depende de nós”. E para isso a Educação é fundamental. A escola deve passar o sentimento de nossas responsabilidade com o futuro, deve ensinar a Terra como Gaia, o maior organismos vivo. Disse que o homem nasceu no interior do coração das estrelas vermelhas, e como nasceu de estrelas, nasceu para brilhar e não para sofrer. E com isso encerrou sua participação, sendo muito aplaudido.
MARINA SILVA
A senadora falou de improviso, e dirigiu-se a platéia como uma professora do Ensino Médio, dizendo-se honrada por estar entre dois mestres. Como se esperava, falou da de suas raízes amazônicas, das riquezas e potencialidades da Amazônia, principalmente na produção de água (cerca de 20 bilhões de toneladas/ dia, disse ela). Disse que a educação entra como uma forte contribuição para uma nova maneira de caminhar.
Eu nunca havia atentado para essa analogia: somos caminhantes que se esqueceram de caminhar e vivem correndo. O caminhante aprecia a estrada e o cenário que surge enquanto caminha; o caminhante é amigo da estrada, da grama, da pedra, dos bichos e do céu. Isso é o que Capra chama de Ecologia Profunda. Concordo com a senadora que a escola deve ensinar a caminhar, mas o diabo é que nos professores também precisamos aprender.
Quanto a crise, Marina Silva disse que é preciso resolver a crise econômica junto com a crise ambiental. Não se pode dissociar uma da outra. Ela também falou que todo ser humano tem desejos, e isso é muito natural e necessário para seu progresso, mas o “erro é alguém achar que sobrepor seu desejo ao desejo do outro”. Marina evocou uma reflexão sobre a cultura da sociedade mercantilista atual, que prega que tudo é possível quando se tem dinheiro; que a felicidade se pode comprar como uma mercadoria de prateleira, medida, pesada e adquirida com moeda sonante. E, nesse cenário, ela convoca à transgressão, a ressignificar nosso ensinar e mesmo nossos conteúdos pedagógicos.
Num momento de confidências, a senadora disse: “Eu aprendi a ler com 16 anos, no Mobral. E foi um momento mágico quando li ‘Banana’. Eu sabia Matemática, mas não sabia ler. Quando vi as letras que a professora colocou no quadro:, eu fiz a soma: B+A+N+A+N+A. Eu sabia o que fazer quando aprendi “banana’: dei uma banana para o analfabetismo.”
Falando de uma questão de gênero, Marina Silva disse que o papel da mulher foi desprestigiado e desvalorizado por milênios, e que a civilização patriarcal é uma civilização manca, e que precisa aprender a caminhar com suas duas pernas, o masculino e o feminino. Para encerrar, falou da analogia do Arco e da Flecha, de sua experiência como ministra e do apoio que recebeu da população, convocou a todos para refletirem sobre a defesa dos direitos dos que ainda não nasceram, dizendo que é compromisso dessa geração garantir um planeta melhor para os que virão, e concluiu com um poema de sua autoria.
Neste instante todo o auditório se levantou e começou a aplaudir efusivamente. Foi um momento de pura emoção de ambas as partes, da conferencista e de seus ouvintes.

12 comentários:

Suzana Gutierrez disse...

Oi Franz

Obrigada por compartilhar. Devem ter sido muito inspiradoras estas falas do FSM.

abraços!

Conceição Rosa disse...

Oi Franz
A primeira coisa que me chamou a atenção no post foi a figura do cartaz, e a sua concepção de "sulear" o mundo. Coisas de quem dia dia leu Paulo Freire.
Eu gostaria de poder ter presenciado este evento. Os três palestrantes estão entre as figuras públicas que mais admiro neste país.
Repetindo Boff e minha mãe: "quem ama, cuida".

Anônimo disse...

Franz
Muito obrigada, mesmo distantes conseguimos ver o entusiasmo, seus olhos brilhando a cada palavra, olha que não lhe conheço! mas foi maravilhoso poder compartilhar essa momento contigo!!
Grande abraço
Karine Pinheiro
karinepinheiro@yahoo.com.br

Claudia disse...

Que bom que existem pessoas como você, com esse espírito de repartir conhecimento.
Eu não vou participar do Fórum, por isso ficarei ansiosa pelas suas postagens do "Mídias".
Falando em compartilhar: foi lançado essa semana um livro (descobri há 20 minutos!), que está disponível pra download. "Blogs.com: Estudos sobre blog e comunicação", organizado pela Araci Amaral e outros.
Claro! Serviço completo: http://www.sobreblogs.com.br/blogfinal.pdf

Maria disse...

Oi, Franz!

Que ótimo vc compartilhar conosco estes momentos tão ricos de nossa educação e mais ainda com a participação dos três grandes palestrantes pelos quais tenho grande admiração.Obrigada,colega.
Vc saberia nos dizer qual o poema da Marina Silva? Gostaria de lê-lo.
Abraços

Anônimo disse...

Franz: continue postando informes sobre o evento; indicarei a sua página aos meus amigos interessados no que acontece no FSM. Gostei do tom descritivo; um abraço.
Doralice Araújo, professora de Redação, em Curitiba
www.gazetadopovo.com.br/blog/namira

Sérgio Lima disse...

Opa Franz!

Sendo repetitivo; obrigado por compartilhar conosco suas impressões e uma parcela desta experiência.


Ficarei no aguardo de mais drops do evento!


abração pra ti

Sérgio Lima disse...

Opa Franz!



Esqueci de falar eu adoro a perspeciva de um mundo visto do Sul... aliás tenho um texto e sempre trabalho isto com meus alunos :-)

O texto pode ser lido aqui.

abraços

Anônimo disse...

Olá Franz, muito boa esta sua atitude de compartilhamento. Obrigado!

Roseli Venancio Pedroso disse...

Oi Franz
Bem legal seu texto e suas reflexões. Estarei sempre por aqui para saber das novidades.
Abraço

sntmendes disse...

Oi Franz
Caramba professor! estou muito orgulhosa de ter lhe conhecido. Você foi explendoroso em seus commentários sobre o FSE E FSM. Estou ligada em seu blog! Saudades Socorro Mnedes.

sntmendes disse...

Oi Franz
Caramba professor! estou muito orgulhosa de ter lhe conhecido. Você foi explendoroso em seus commentários sobre o FSE E FSM. Estou ligada em seu blog! Saudades Socorro Mnedes.

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