sábado, 31 de janeiro de 2009

O Encontro dos Presidentes no FSM

Continuando com a postagem de ontem, eis a segunda e última parte do encontro dos 5presidentes no FSM.

ANA JÚLIA CAREPA
A Governadora disse que aqui, na Amazônia, estamos implantando um novo modelo de desenvolvimento para as gerações futuras. Falou que o projeto de plantar 1 bilhão de árvores em 5 anos, é o maior projeto de recomposição de árvores do planeta, e que deve ser um exemplo para o mundo. Disse que é difícil desenvolver “políticas de combate a rapinagem dos recursos naturais”, mas “o Pará é o campeão na diminuição da violência no campo”. Para concluir, a governadora solicitou ao Comitê Internacional do Fórum que considerasse Belém, mais uma vez, sede do próximo encontro.
Em seguida falaram a representante da Confederação Sindical Internacional, uma líder indígena equatoriana e a representante do Fórum de Mulheres da Amazônia . Umma faixa negra com os dizeres: “Lula o capitalismo fracassou. Obama administrar sua crise” e qualquer coisa endereçada a Hugo Chávez, que não consegui entender nem fotografar, surgiu, causou burburinho e interesse de todos , e pouco depois desaparecia.
Os discursos das 3 mulheres transcorreu sobre os problemas sociais dos povos explorados pelo capitalismo, alertando que o tecido social e econômico mundial encontra-se cada vez mais desgastado, puído; e deve-se temer o pior. Pediram a união dos presidentes para mudanças que respeitem os direitos dos povos indígenas, dos afrodescendentes, que garantam as conquistas das mulheres e dos trabalhadores, e que defendam a Mãe Terra. A última oradora também condenou a aliança da Igreja com o Estado, no sentido de criminalizar a mulher que provoca aborto.
Os discursos dos presidentes da Bolívia, Equador, Colômbia e Paraguai mantiveram-se no mesmo tom e harmonia que ate parecia ensaiado. Suas falas atacaram, veementemente, o capitalismo, o neoliberalismo, “a forma imoral de acumulação de riquezas, que levou o planeta a ruína e a devastação ambiental”; a política de lucros a qualquer custo; a ambição desenfreada da América do Norte; a política do Presidente Bush . Apontaram o socialismo como única via de progresso e retomada do bem estar social, pois “o socialismo nos fala de atuar em conjunto, de atuar em comunidade (... ) se expressa com a ação do Estado” (Evo Moralez); “o Socialismo é o único caminho para salvar este planeta, para salvar a vida humana. Não há outro” (Hugo Chavéz).
Evo Moralez disse:“Para mim não há nada mais importante que governar com os humildes, com os lutadores” e “depois do que vimos em Gaza, não temos dúvida que os imperialistas estão dispostos a tudo para manter seu poder.” Segundo ele, “é preciso encontrar alternativas para o capitalismo ou ele continuaria destruindo tudo”, e apresentou suas propostas de campanhas mundiais para salvar a Terra do capitalismo, passando pela restituição da dignidade e resgate da diversidade cultural dos povos, e pela paz e justiça planetária. Disse que os responsáveis pelo genocídio em Gaza deveriam ser levados à justiça, e que era preciso acabar com o direito de veto do Conselho Mundial de Segurança, pois “Não é possível que um país tenha mais poder que 190 nações”. Também condenou o bloqueio a Cuba.
Rafael Correa disse que, há alguns anos, ninguém acreditaria que um índio e um metalúrgico seriam presidentes de seus países, e que isso só foi possível porque eles eram reflexos de seus povos. Complementou dizendo que depois de séculos de resistência, os processos de luta estavam dando resultados e redesenhavam o mundo pós-crise. Disse, ainda, que no Equador um índio tem 90 a 95% de chances de nascer e morrer pobre.
O presidente Fernando Lugo disse que era preciso “enfrentar com dureza e ternura os gigantescos moinhos” do neoliberalismo, uma clara alusão a dois heróis visionários, Che Guevara e D. Quixote. Mas também fugiu um pouco do riscado ao aproveitar para reclamar da parte que cabe ao Paraguai, na partilha da energia de Itaipu. Pediu o fortalecimento da economia do continente sul-americano, da cultura e proteção a água e a terra. Concluiu lembrando Geraldo Vandré: ”Caminhando e cantando com a história na mão.”
Hugo Chavéz disse que, a cada ano, o evento político mais importante do mundo era o FSM, que fomenta mudanças para a América Latina. “Assim como a AL e Caribe receberam a maior dose do veneno do neoliberalismo, também foi onde o movimento que está começando a mudar o planeta eclodiu com maior força. Um outro mundo é possível e está nascendo na América Latina.”
Para Chavéz, não será fácil enfrentar a crise mundial. Alerta para que 50 milhões de postos de trabalho serão perdidos este ano e que a fome vai crescer, por isso a AL deve se unir: “É assim que quero me sentir hoje, a unidade verdadeira”.
O discurso mais esperado era do Presidente Lula. Penso que pelo teor das falas de seus antecessores ele tenha se visto numa saia justa, pois não podia destoar dos discursos anteriores, mas também não desejava fazer um discurso político por excelência, com ataques aos EUA e Israel. Mas saiu-se muito bem discursando de improviso.
Lula disse que o mundo esta’ mudando e que “Num país que há 40 anos matou Luther King, ninguém poderia imaginar que um negro chegasse a presidência?”
Segundo Lula, “Evo foi vitima de um golpe com 2 anos de mandato, e mesmo com nossas divergências sabemos que não devemos permitir que um companheiro possa perder o mandato porque os poderosos dizem que ele é irresponsável”. Disse que em 2005 fora vítima da mesma campanha; que o FMI vivida dando palpites o tempo todo no Brasil, que viveu os tempos duros em que o mundo desenvolvido vivida dizendo o que se devia ou não fazer na América Latina, mas que “agora está provado que Deus escreve certo por linhas tortas: a crise não é nossa, é deles”. Para ele “a crise nasceu porque a lógica era que o Deus Mercado é que iria desenvolver os países e fazer a justiça social (...) Agora quando eles entraram em crise qual foi o Deus que eles pediram socorro? O Estado.”
Lula disse que ainda não conhecemos o fundo da crise, mas que os países em desenvolvimento tem mais chances de sair dela, e confidenciou que, numa conversa com o presidente Bush, disse-lhe que os ricos não precisavam ganhar tanto, mas os pobres, sobretudo o continente africano deveria ser mais atendido. Mas agora Buhs carrega na biografia, entre outras coisas negativas, a Guerra do Iraque e a pior crise econômica que o mundo já viu. Disse que “aqui, neste país, o povo pobre não será o pagador dessa crise”, e que a “Petrobras vai investir 174 bilhões de dólares e não pode atrasar porque queremos empregos.”
Lula também falou da questão do gás boliviano, afirmando que “quando Morales nacionalizou o gás, tinha gente que dizia que eu era frouxo, porque não defendia o Brasil. Mas eu defendia que um metalúrgico se São Paulo não ia brigar com um índio da Bolívia. Nossas relações melhoraram muito.” Disse, ainda, que: ” temos que respeitar a soberania, e ando pelo mundo defendendo o Chavéz".
Para finalizar disse: “Nós somos os presidentes mas são vocês que dão a direção”.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

FÓRUM SOCIAL MUNDIAL- Drops do 3º DIA

Caro leitor, essas últimas postagens tem sido um tanto longas, me desculpe. Por isso estarei postando meus drops do 3º dia em duas partes.

Primeira Parte

Chegamos ao Hangar pouco depois das 15 horas, para um evento marcado para ter início as 19h. Na entrada do estacionamento, apenas grupos de índios e carros autorizados passavam. Dezenas de ônibus com as caravanas de diversos partidos de esquerda aguardavam sua vez. Ouvi alguém da organização dizer que havia mais de 5 mil pessoas aguardando nos ônibus, mas só depois de 2 horas os ônibus tiveram permissão para entrar, e eu me espremi num deles.
Depois de entrar numa fila e passar pelo detector de metais, estamos no ambiente climatizado do Centro de Convenções. Sobre uma plataforma havia dezenas de cinegrafistas. Notei que o espaço estava dividido em quatro áreas distintas: uma para as comunidades indígenas, uma para autoridades e convidados, uma para os grupos dos ônibus e a última, mais distante do palco e sem cadeiras, reservada para o povão do lado de fora. E quando as portas foram abertas, o pessoal que aguardava do lado de fora começou a entrar e invadir a área com cadeiras, causando protestos e confusão com a equipe que fazia a segurança.
Um grande grupo da União da Juventude Socialista (JS) exigia ser levado para a área reservada às caravanas de partidos socialistas. Como protesto começaram a entoar palavras de ordem , mas foram atendidos e seguiram em fila, todos de mãos dadas para não permitir a entrada de quem não pertencesse ao movimento. A mim pareciam aquelas crianças que a professora leva para um passeio no bosque Rodrigues Alves, mas como eu precisava passar para a área VIP, chegar mais perto do palco e obter fotos melhores, entrei no trenzinho (o que um blogueiro não faz por uma boa postagem).
Num palco lateral acontecia uma programação musical, enquanto os presidentes não chegavam. Beto e Leno, dupla de Castanhal, cantava musicas country, mas para minha sorte entrou, em seguida, Mini Paulo e seu quarteto, famosos por tocar música instrumental de alta qualidade. Depois vieram os bois Garantido e Caprichoso, de Parintins (Amazonas). Segundo o apresentador, era a primeira vez que os dois bois rivais se apresentavam no mesmo palco. Ao entoarem “Vermelho”, consagrada na voz de Fafá de Belém e cantada durante a campanha que elegeu Lula, a platéia cantou junto numa explosão de satisfação. Mas ao final tive que aturar mais country da dupla de Castanhal...
Enquanto isso a JS, em pé sobre as cadeiras, agitava bandeiras e gritava palavras de ordem. Penso que não queria perder a oportunidade de aparecer diante do mundo. E como onde há jovens sempre surge uma sadia molecagem, o rapaz na fila da frente encheu um preservativo, e atirou o balão para o ar. Em pouco tempo balões de camisinha, parecendo grandes salsichas brancas, estavam subindo ao sabor de tapas, tão logo ele descia.
A presença dos jovens era praticamente maciça, mas vi uma criaturinha simpática, que devia ter uns 70 anos, caminhando como se passeasse por entre os canteiros de sua horta. A velhinha trazia um chapelão de palha onde se lia: “Que crise é essa?”.
Perto das 20 horas chegaram a Governadora do Pará, Ana Júlia, a ministra Dilma Roussef, o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc e comitiva. Mas todos queriam ver os presidentes Hugo Chávez (Venezuela), Rafael Correa (Equador), Evo Morales (Bolívia), Fernando Lugo (Paraguai) e o Luizinho, do Brasil.

quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

FÓRUM SOCIAL MUNDIAL- Cenas do 2º Dia

Caro amigo leitor, no segundo dia do FSM eu dividi meu tempo entre a UFRA e a UFPA, acompanhando um casal de amigos hospedados aqui em casa. Ele é José Valdi, músico, cantor, compositor e atual Secretário de Cultura de Conceição do Araguaia, e ela é a professora Neuza, sua esposa.
Começamos indo para a UFRA, pela Av. Tancredo Neves (antiga Perimetral), uma avenida de apenas duas pistas e sem acostamento, que enfrenta um fluxo intenso nesses dias de fórum . Cerca de 2 km antes topamos com um engarrafamento, já diante da Universidade outra dificuldade: lugar para estacionar. Um cartaz de papelão preso num poste dizia: Estacionamento R$ 3,00 a hora, e uma seta indicava a direção, mas passei direto: Tá maluco, nem no estacionamento do Shopping é esse preço! Neguinho está apelando.

CENAS DO FSM NA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ-UFPA
Estou preparando um slideshow com mais imagens. Volte amanhã no fim do dia. OK?

Seguimos para a UFPA, onde aconteceriam diversos eventos de nosso interesse. Afora isso, queríamos ver como estavam as coisas por lá. A UFPA é uma das mais belas, senão a mais bela, universidade federal do Brasil. Não propriamente por sua arquitetura, mas por sua área, arborização e localização. Fica bem às margens do Guamá, rio de cor de caldo de cana que banha a cidade. Por todo campus haviam tendas e barracas com algum tipo de manifestação política, social, cultural ou tudo isso junto. Num grande palco, perto da Reitoria, apresentou-se um grupo de índios Assurini, depois alguém leu um manifesto, em inglês, enquanto o Sol castigava a platéia.
Cruzei com duas simpáticas e agradáveis jovens do Quênia, que chamavam a atenção por seus trajes típicos. E como estava decidido a registrar algumas cenas do FSM para este blog, achei que elas seriam um material culturalmente interessante. Elas falavam desembaraçadamente o inglês, e como my english is broken, apenas pedi licença para tirar uma foto e registrar seus nomes: Hindou e Naini Meriwas. Em segundos nos vimos cercados e os muitos passantes também queria um foto ao lado delas, e as jovens aquiesciam gentilmente. Fiquei observando de lado. A mim parecia que as pessoas posavam ao lado delas como posavam ao lado dos índios que transitavam pelo local: como se exibisse um troféu exótico, curioso, contrastante.
Sai dalí e perguntei a uma jovem que passava com um adesivo da CUT nas blusa: Você pode me dizer onde fica a exposição de fotos de Cuba? Ela me olhou assim meio a pedir desculpas e respondeu em francês. Como o meu francês é mais “broken” que o meu inglês, eu disse “Merci” e continuei a busca.
Na tenda em homenagem aos 50 anos da revolução cubana, além de uma exposição fotográfica dedicada a revolução, com fotos originais vinda de Cuba, havia uma palestra da senadora Marina Silva. Na entrada da grande tenda um grupo de palestinos distribuíam panfletos e cartazes pedindo uma pátria livre. É como disse Marina Silva: “Esse fórum é uma verdadeira pororoca de idéias.”
Quando já íamos para casa almoçar, cruzei com um duas jovens e ouvi o seguinte trecho da conversa: “Estou cagando para o país de onde ela veio. Chegou aqui tem que falar o português.” Hum! Também penso que não temos nenhuma obrigação de falar no idioma do turista estrangeiro. Ele é que, ao vir para cá, deve tentar se comunicar na minha língua, mas de forma alguma irei tratá-lo mal por isso.
Pela tarde, nosso destino foi a UFRA. O céu estava carregado de nuvens escuras e esperei que desabasse aquele toró, para amenizar o calor brabo que fazia, mas ela não veio. Ou melhor, veio somente quase às 19 horas, quando já estávamos chegando em casa.

CENAS DO FSM NA UNIVERSIDADE FEDERAL RUAL DA AMAZÔNIA-UFRA
Diante da entrada da UFRA o comércio informal explodiu quase instantaneamente, e do lado de dentro também. Havia de um tudo, como numa verdadeira feira. Muitos vendiam água mineral e cerveja, uns vendiam chapéu, camiseta, chaveiros, lanches, refeição em quentinhas, guaraná, guarda-chuva, bombons regionais, balas, chope de frutas (que nalguns lugares é sacolé), picolé e o escambau.
Num canto um senhor vendia mel de abelha, noutro uma mulher com um punhado de calcinhas pendurada nas mãos oferecia aos passantes. Pelas laterais da estrada que leva aos pavilhões e tendas das conferências, palestras, debates etc, dezenas de artesãos daqui e de outros estados expunham seus produtos. Centenas de “hippies” vendendo seus brincos, colares, pulseiras e outros adereços feitos de linha, metal, contas, arame e outros materiais. Em um grupo do Equador comprei um “regalo” para minha mulher.
Parei para fotografar uma pizzaria bem original. Numa barraca rústica, uma placa dizia vender Pizza em forno de lenha. O forno era bem artesanal, feito com telhas e barro colhido ali mesmo. Ainda se via tufos de capim, mas não cheguei a conferir a pizza, por motivos óbvios. E apenas para não esquecerem que estavam na Amazônia, uma placa alertava para ter cuidado com animais peçonhentos.
Propagandistas distribuíam folders de empresas. Uma equipe distribuía uma edição especial d’O Jornal Diário do Pará, enquanto militantes das mais diversas organizações distribuíam panfletos e material de manifestos. E gente chegando! Muita gente bonita, saudável e alegre. Em sua grande maioria eram jovens mochileiros. Para todo canto que se olhasse, e a todo instante, havia alguém fotografando alguém ou alguma coisa. Mas todos traziam largos sorrisos e olhares gulosos. Eu me sentia numa imensa festa policrômica, polifônica, poliétnica, mas composta por um único e só povo. Esse era o espírito que pairava sobre as águas amazônicas e sobre a gente daquele lugar.
Ouvi um rapaz dizer para uma jovem: “... o Festival de Woodstock”. Fiquei imaginando se ele se sentia como no famoso festival de 1969. Achei que de fato havia alguma similaridade, pois Woodstock congregou diversos estilos musicais e formas de livre expressão, reunindo milhares de jovens em torno de um movimento pacifista, mas contestador e carregado de uma forte critica social. Lá, como aqui, causou grande confusão no trânsito e agitou, social e econômicamente, as imediações onde se realizou.
Ali, na UFRA, havia centenas de barracas que, como cogumelos gigantes ou como enormes flores do campo, mudaram completamente a paisagem daquela Universidade. Um Hare Krishna solitário vendia seus incensos, e um grupo de gaiatos caricaturavam Obama e sua mulher, enquanto outros vestidos de mulher gozavam com os passantes. Mais adiante, numa barraquinha que vendia instrumentos de percussão, um grupo pegou alguns dos instrumentos e improvisou uma roda de samba, que depois virou capoeira. É, é assim nesse maravilhoso Brasil: colocamos o humor e a alegria em tudo que fazemos.
Um cara dava uma entrevista para uma reporte e um cinegrafista da Record (sei pelo símbolo no microfone). Ele falava de sua coleção: bicicletas. Parei para ouvir e conversar. Soube que era um fluminense de Itatiaia (RJ) que vivia em Belém e que tinha 62 bicicletas. Guardava desde seu primeiro velocípede, e a jóia da coleção era uma bicicleta com transmissão por eixo cardan, a única que já vi.
Um pequeno grupo de mulheres com uniformes de coletadores de lixo da prefeitura passou recolhendo o que os participantes atiravam ao chão. Percebi que, além das discussões, debates e enorme produção intelectual, todo aquele povo produzia também muito lixo. Encostada a um poste uma pequena jovem ostentava um cartaz onde se lia, em português, inglês e espanhol, que estava sem dinheiro e precisava de ajuda para ir para casa, pois havia sido assaltada. Do outro lado da estrada, alguns grafiteiros decoravam as paredes de compensado do banheiro comunal.
Faltando alguns minutos para as 18h o Sol ainda nos aquecia, e a ausência de vento tornava o calor maior e ajudava a minha transpiração. Resolvemos ir embora. E ainda estava chegando gente! O que se via ali era como uma eclosão de primavera, com tudo que ela traz de esperança, alegria, fecundidade, dádiva e benção. Como disse Che Guevara: “Os poderosos podem matar uma, duas ou até três rosas, mas nunca poderão deter a primavera”. .

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

FÓRUM MUNDIAL DE EDUCAÇÃO- Algumas momentos

Saí, hoje (26/01) pela manhã, com destino a Universidade Federal Rural da Amazônia-UFRA, localizada na Av. Tancredo Neves (antiga Perimetral). Ia confirmar minha inscrição no Fórum Social Mundial. A UFRA fica na periferia de Belém, no pobre e violento da Terra Firme (o nome atual é Bairro Montese, mas todo mundo continua usando o antigo), onde também se localiza a Universidade Federal do Pará e uma parte do Museu Goeldi.
Depois da recapagem e melhorias implementadas pelo governo, como limpeza dos canteiros, melhor sinalização e iluminação, câmeras de vigilância, foi a primeira vez que trafegava por ela. A estrada está em excelentes condições, mas o trânsito estava bem congestionado na porta da UFRA, com vários agentes de Trânsito (CTBEL) e guardas municipais orientando os fluxo de carros e ônibus. Vi diversas barracões armados e uma dúzia de ônibus estacionados no interior do campus. Por todo lado centenas de jovens se movimentavam com suas mochilas e roupas coloridas. A cena me lembrou uma revoada de borboletas que vi certa vez na estrada Belém - Bragança.
Dentro do ginásio da UFRA o atendimento foi bem rápido e saí de lá devidamente encrachatado, com a sacola do evento a tiracolo. Meu destino: o Hangar, Centro de Convenções e Feiras da Amazônia, onde acontecia a abertura do Fórum Mundial de Educação. Também me inscrevi no Fórum Mundial de Mídias Livres, que a princípio fora previsto também para o Hangar, mas chegando lá soube que havia mudado para a Escola de Aplicação da UFPA (antigo NPI), também na Av. Perimetral. Diante da impossibilidade física de estar em dois locais ao mesmo tempo, e como estava muito interessado na conferência “Educação, Transgressão e Construção da Cidadania Planetária”, proferida pelos mestres Moacir Gadotti, Leonardo Boff e pela senadora Marina Silva, optei por deixar o FMML pra depois. Abaixo alguns momentos da conferência de abertura.

MOACIR GADOTTI
Gadotti iniciou a conferência falando de esperança: “vivemos em esperança”, disse. E continuou: “Aqui não estamos para trazer respostas, pacotes, estamos para celebrar, para entender juntos (...). Viemos aqui para aprender”. Para introduzir o tema da conferencia, Gadotti utlizou-se da logo do Fórum (vide imagem), dizendo que ela mesma já representava uma transgressão, pois “aprendemos a ver o mundo a partir da visão do Norte e a imagem apresenta o mundo a partir da visão do Sul”.
Sua fala discorreu sobre uma proposta de “Pedagogia da Transgressão”, de uma “Cidadania Ambiental como parte fundamental da Cidadania Global”, e recordando que no ano passado completamos 40 anos da Pedagogia do Oprimido, deixou claro que é pela educação, conforme pregava Paulo Freire, que um outro mundo é possível. E encerrou citando um trecho de um poema do amazônida Thiago de Mello, em que indaga “Que lição pode nos dar o rio Amazonas?”
LEONARDO BOFF
O teólogo iniciou expressando sua grande admiração pela senadora Marina Silva. E em dado momento disse: “Marina Silva seria a governadora do mundo, mas nos contentamos que ela seja a governadora do Brasil”. Os aplausos de todos na platéia mostraram que isso era uma unanimidade entre os presentes.
Boff falou de desafios da sociedade planetária, dizendo que não gosta da expressão ‘globalização’, preferindo ‘mundialização’, que acha mais apropriada. E falou que somos todos africanos, porque a espécie humana nasceu na África. Disse que a civilização planetária vive uma série de crises, e “em último termo a Terra poderá continuar, mas poderá continuar sem nos, os seres humanos”. Para ele é necessário que o ser humano conserve o capital natural e distribua os benefícios com toda a humanidade.
Segundo Boff, o que o mundo precisa é de cuidado. “O cuidado é o gesto amoroso com a realidade. O cuidado regenera os estragos que temos feito, o cuidado previne estragos futuros. Se nossas mães não tivessem o cuidado em nos acolher nos não estaríamos aqui.” Para ele é a atual forma de economia de mercado, com a exploração de todos por poucos, a principal responsável pelo agravamento da crise mundial.
Falando das previsões de analistas com relação ao futuro da Terra, Leonardo Boff afirmou que “a partir de 2030 começa a desolação total” e fez um veemente apelo para que cuidemos do planeta, e disse que somente pela solidariedade e cooperação poderemos superar os problemas criados pela acumulação mundial. Apontou “5 princípios que vão sustentar o novo ensaio civilizatório” e as 4 virtudes fundamentais, que são:
1-Hospitalidade (como direito e dever de todos). Esse conceito, explicou, é de Emanuel Kant ao propor sua idéia de uma república mundial.
2-Convivência. “Nós não vivemos, nos convivemos”, disse ele. E acrescentou que “conviver com o outro e aceitar as diferenças não é tão fácil. Mas é importante não deixar que a diferença decaia para a desiguladade”.
3-Tolerância – Para Boff “há uma falta mundial de tolerância. Tem gente que diz: a minha verdade é a única... Daí vem as guerras e os conflitos.”
4-Comensalidade – Boff esclareceu que comensalidade era uma prática do Cristo, e significa sentar juntos e desfrutar da generosidade da terra. Sentar em torno da mesa e partilhar irmanamente dos frutos da terra é um sonho presente em toda história. Reforçou o sagrado direito de todo ser humano se alimentar com dignidade, e elogiou o Fome Zero e a política do Presidente Lula nesse sentido.
Para finalizar, Leonardo Boff deixou palavras de esperança quando disse que “o cenário não é de tragédia, é de crise. Essa crise nos vai mostrar que podemos viver melhor e mais com menos”. Com menos devastação da natureza, com menos violência, com menos ambição e busca pelo prazer e acumulação desenfreada, com menos sofrimento. E uma de suas frases tocou fundo na platéia: “O terrível do sofrimento não é o sofrimento, é o abandono no sofrimento”.
Para ele a crise é uma chance de repensarmos o que temos feito com nosso planeta, “mas a crise não se transformará numa tragédia. Isso depende de nós”. E para isso a Educação é fundamental. A escola deve passar o sentimento de nossas responsabilidade com o futuro, deve ensinar a Terra como Gaia, o maior organismos vivo. Disse que o homem nasceu no interior do coração das estrelas vermelhas, e como nasceu de estrelas, nasceu para brilhar e não para sofrer. E com isso encerrou sua participação, sendo muito aplaudido.
MARINA SILVA
A senadora falou de improviso, e dirigiu-se a platéia como uma professora do Ensino Médio, dizendo-se honrada por estar entre dois mestres. Como se esperava, falou da de suas raízes amazônicas, das riquezas e potencialidades da Amazônia, principalmente na produção de água (cerca de 20 bilhões de toneladas/ dia, disse ela). Disse que a educação entra como uma forte contribuição para uma nova maneira de caminhar.
Eu nunca havia atentado para essa analogia: somos caminhantes que se esqueceram de caminhar e vivem correndo. O caminhante aprecia a estrada e o cenário que surge enquanto caminha; o caminhante é amigo da estrada, da grama, da pedra, dos bichos e do céu. Isso é o que Capra chama de Ecologia Profunda. Concordo com a senadora que a escola deve ensinar a caminhar, mas o diabo é que nos professores também precisamos aprender.
Quanto a crise, Marina Silva disse que é preciso resolver a crise econômica junto com a crise ambiental. Não se pode dissociar uma da outra. Ela também falou que todo ser humano tem desejos, e isso é muito natural e necessário para seu progresso, mas o “erro é alguém achar que sobrepor seu desejo ao desejo do outro”. Marina evocou uma reflexão sobre a cultura da sociedade mercantilista atual, que prega que tudo é possível quando se tem dinheiro; que a felicidade se pode comprar como uma mercadoria de prateleira, medida, pesada e adquirida com moeda sonante. E, nesse cenário, ela convoca à transgressão, a ressignificar nosso ensinar e mesmo nossos conteúdos pedagógicos.
Num momento de confidências, a senadora disse: “Eu aprendi a ler com 16 anos, no Mobral. E foi um momento mágico quando li ‘Banana’. Eu sabia Matemática, mas não sabia ler. Quando vi as letras que a professora colocou no quadro:, eu fiz a soma: B+A+N+A+N+A. Eu sabia o que fazer quando aprendi “banana’: dei uma banana para o analfabetismo.”
Falando de uma questão de gênero, Marina Silva disse que o papel da mulher foi desprestigiado e desvalorizado por milênios, e que a civilização patriarcal é uma civilização manca, e que precisa aprender a caminhar com suas duas pernas, o masculino e o feminino. Para encerrar, falou da analogia do Arco e da Flecha, de sua experiência como ministra e do apoio que recebeu da população, convocou a todos para refletirem sobre a defesa dos direitos dos que ainda não nasceram, dizendo que é compromisso dessa geração garantir um planeta melhor para os que virão, e concluiu com um poema de sua autoria.
Neste instante todo o auditório se levantou e começou a aplaudir efusivamente. Foi um momento de pura emoção de ambas as partes, da conferencista e de seus ouvintes.

sábado, 24 de janeiro de 2009

O Planeta Movido a Internet é Escravo da Tecnologia

Se há uma coisa que gosto é da nossa cultura popular, principalmente as da região Norte e Nordeste, afinal sou alagoano de nascimento (de Pajuçara- Maceió), embora tenha ido para Nova Iguaçu (RJ) ainda um bebê. E, ainda que minhas referências mais significativas estejam em terras iguaçuanas, como nordestino, filho e neto de nordestinos , só poderia carregar no sangue e na alma um buquê de aromas, sabores, sons e cores do Nordeste.
Uma das manifestações do folclore nordestino que mais gosto são a literatura de cordel e os desafios entre cantadores repentistas. Aprendi um pouco sobre essa arte popular belíssima com um dos maiores poetas populares e repentistas do Brasil: José João dos Santos, o Mestre Azulão , morador de Nova Iguaçu, amigo da família do Mestre Vitalino e amigo de meu falecido pai, Waldick Pereira.
Sempre de chapéu, óculos ‘ fundo de garrafa’ e uma memória prodigiosa , Azulão contava causos que nos fazia chorar de tanto rir. Assisti a vários shows do Azulão, tanto em escolas quanto na Feira de S. Cristovão, e conversei muito com ele, lá no Instituto Histórico e Geográfico de Nova Iguaçu-IHGNI, do qual meu pai foi fundador e presidente, até sua morte em 1984. Cheguei até a fazer a capa de um de seus cordéis sobre N. Sª. Aparecida (quando encontrá-lo, entre meus guardados, irei escanear e colocar aqui).
Com ele aprendi sobre outros poetas e cantadores, como Cego Ederaldo e Zé Limeira, o “poeta do Absurdo” da Paraíba; ri muito das histórias que seus olhinhos miúdos, por detrás das grossas lentes. testemunharam, registraram e ele desaguava em forma de versos. Dele ganhei um LP com seu depoimento gravado pelo Museu da Imagem e do Som , uma raridade. Foi assim que aprendi a gostar de cordel, de cantorias e desafios de cantadores; a reconhecer uma sextilha, um decassílabo, um Martelo Agalopado, um Martelo a beira mar, um quadrão oitavado. Me lembro de uma frase de uma poesia que ouvi dele: “Naquele lugar a aurora era tão bela, que Cristo da janela se debruça pra espiar”.
O poeta popular do interior do Nordeste, na rudeza típica do agreste que endurece e tempera o caráter, e na singeleza de seu fazer cotidiano, que veste sua alma de poesia e revela sua natureza humana solidária, encontrou o mote de sua vida. Aprendeu a cantoria de viola, a improvisação do verso e da trova, as rimas ricas e a métrica perfeita de uma sextilha ou um decassílabo bem arredondado, não foi num banco escolar, foi vendo e ouvindo. Aprendeu porque é de sua natureza aprender aquilo que está em sintonia com sua essência. Acho que aprenderam a poesia popular e a tocar viola ou rebeca, por osmose.
Atualmente, acontece em Pernambuco um Desafio de Cantadores, que resgata a beleza das disputas entre repentistas que devem provar seu valor no improviso, na criatividade do verso bem rimado, na agilidade do estilo e no açoite cortante da palavra que desbanca o desafiante.
"Os Nonatos", dupla composta por Raimundo Nonato (Paraíba) e Nonato Costa (Ceará), são considerados uma das melhores duplas de cantadores e repentistas, sendo famosa também por compor para grandes bandas de “foró”, como Aviões do Foró, Mastruz com Leite, Caviar com Rapadaura, Saia Rodada. Você, amigo professor Veja e ouçam que primor de poesia, original e muito bem elaborada em decassílabo, cujo mote é "O planeta movido a internet é escravo da tecnologia". Pode ser um excelente material para suas aulas.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Novos Indicados ao Prêmio DARDOS

Ganhamos mais uma flechada com o DARDOS. Desta vez da arquiteta, professora e blogueira Cláudia, do excelente Marcos do Tempo. Claudinha, muito obrigado. E agora acho que, depois deste que é nosso 8º Prêmio DARDOS, devo divulgar meus novos indicados.
A maioria dos meus escolhidos ainda não foi contemplada com o sêlo, mas esse não foi meu critério maior. Me guiei pelo que apresentam de conteúdo e pelo que me tocam com suas reflexões. Não indicarei 15 desta vez, mas apenas a metade. São eles:

Blog do Poeta Antonio Juraci Siqueira, o filho do Boto; Olhar que Dialoga, da amiga Rosita Ribeiro; o Blog do Grupo Ayvu Rapyta, os Contadores de Histórias da SEMEC; Blog do Prof. Cavalcante, meu amigo pai do Boto; Blog a Linha do Tempo da Invenção Musical, do Roberto Castro; Informática e Educação, da Andrea de Carli; Saia Justa, um blog que fala de vestimentas, mas de forma muito legal;

Parabéns aos novos premiados. A acessem a postagem anterior (clique AQUI) para conhecer detalhes da premiação e como devem proceder para continuar com a rede de prêmios DARDOS.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

CHUPA ESSA MANGA

Amigo Leitor, não sei se você sabe, mas essa Nossa Senhora de Belém do Grão Pará (para os íntimos é simplesmente Belém), é conhecida como "a cidade das mangueiras", a "magueirosa", em virtude da quantidade de mangueiras existentes em praticamente todas as ruas da cidade.
Não sei quantas árvores dessas a cidade Portal da Amazônia possui, mas sei que algumas são centenárrias, e é um prazer inusitado quando o turista se deparar com um túnel de mangueiras. Bem, pelo menos comigo foi assim ao ver o tamanho e a beleza desses túneis formados pelas copas das mangueiras.
Mas no tempo das chuvas as mangueiras causam alguns transtornos: suas folhas entopem bueiros e seus frutos, frequentemente, atingem carros e passantes; isso sem contar que suas raízes destroem calçadas. Tá certo que as mangas, quando caem sobre os carros, amassam a lataria ou quebram os parabrisas; e quando acertam uma cabeça, então? Só quem já levou uma mangada no cocoruto ou já viu alguém cabalear ao ser sido atingido sabe o que digo. Uma amiga professora, ao ser atingida pela manga, recolheu sua agressora do chão e cravou-lhe os dentes, não por vingança, mas porque manga madura é deliciosa, e o paraense tem o hábito de apanhar as mangas que caem. Alguns até param, tranquilamente, o carro ao lado da fruta e abrem a porta para recolher a danada.
No ano passado meu carro levou duas mangadas que apenas amassaram a lataria, mas em 2007 o carro da minha mulher levou três, e uma quebrou o parabrisa, dando um prejuízo de R$ 200 reais. Impertubável, Lenise parou o carro, apanhou a manga do chão, e quando chegou em casa disse para a caçula: Amanda, cupa essa manga. Ela vale duzentos reais!!!
Ah! Você sabia que o belemense é o único cidadão no mundo que tem um seguro especial para seus carros: o seguro contra mangadas? É isso mesmo, um seguro contra a quebra do parabrisa por queda de manga. Desde então Leca tem esse seguro.
Para mim nada disso é relevante, perto do prazer de contemplar essas magestosas árvores ou caminhar à sua sombra, num dia canicular tão comum nessas paragens nortistas. No entanto, li que estão querendo acabar com as mangueiras do centro da cidade. Querem tirar essa beleza toda, só porque alguns acham que as mangueiras dão rejuízos? Que coisa mais estúpida!

domingo, 18 de janeiro de 2009

MATEMÁTICA DE COZINHA NÃO VAI À ESCOLA

Caro leitor, nessa postagem quero lhe falar sobre algo de que gosto bastante: Matemática, ou melhor, Etnomatemática. Ah! Não faça essa cara, e nem se vá para outro blog. Espere! Não vou falar da hermética Matemática acadêmica, ou da mística Matemática Divina (sim, há uma, sabia?). Falarei da Matemática que você emprega nas coisas simples do seu cotidiano, mas nem se dá conta, como aquilo que denomino “Matemática de cozinha”. Já observou quantos conhecimentos matemáticos são necessários para preparar um bolo, uma lasanha, um pão caseiro, um Cassoulet ou Ratatouille? Dia desses provei para a minha empregada, enquanto ela preparava uma caldeirada, o quanto ela sabia de Matemática.
A nossa cozinha sempre esteve rica de Matemática e mal percebemos, talvez porque essa Matemática não seja valorizada pela escola.
O fato é que, para preparar qualquer prato, assim como comprar os ingredientes, é necessário conhecer e empregar algumas unidades de medidas, como o Grama e o Litro. Mas há outras que utilizamos diariamente sem a cerimônia acadêmica dessas duas. São as unidades de medida não convencionais, que fazem parte do que chamamos Matemática Cultural, Matemática Materna ou Etnomatemática. Etnomatemática é um conceito criado pelo eminente matemático brasileiro Ubiratan D’Ambrosio.
Você já deu "uma tragada"? Num cigarro, claro! (Desculpe, eu sou antitabagista, mas é apenas a título de exemplo, certo?). Já tomou "um gole", já usou uma "pitada de sal", um "fio de óleo", "um punhado" de farinha? Já comprou uma “mão de milho”? Pois, então, já empregou essas unidades não convencionais. E se buscar com cuidado, acabará encontrando outras unidades para medir quantidade, massa, volume, área, comprimento e tempo típicas de sua região.
É o caso de algumas curiosas unidades de medidas encontradiças nas muitas comunidades ribeirinhas do Pará, tanto em corriqueiras transações comerciais quanto em atividades de plantio, colheita, pesca, fabricação de instrumentos. Quando cheguei aqui achava estranho ouvir alguém dizer, por exemplo, que vendeu dez rasas de açaí; que comprou um frasco - ou um paneiro - de farinha; que comprou um litro de camarão, uma pêra - ou um cofo - de caranguejo, uma mão de milho; que tem uma tarefa para roçar, que plantou uma carreira de eucalipto, que tem “uma linha de arroz para apanhar”, que viu “uma sucuri com 16 palmos de pé”.
Inspirado em Ubiratan D’Ambrosio, este blogueiro concebe “a disciplina matemática como uma estratégia desenvolvida pela espécie humana ao longo de sua história para explicar, para entender, para manejar e conviver com a realidade sensível, perceptível, e com o seu imaginário, naturalmente dentro de um contexto natural e cultural” (1996, p.7). No entanto, é preciso esclarecer o conceito de realidade que estamos empregando: “here we understand reality in its broadest sense (i.e. natural, physical and emotional, into which the individual is immersed) and individual as an element of this reality wich, being part of it, performs inteligent actions, which will reflect upon this reality” (D’AMBROSIO, 1985, p.15).
Nessa teia do fazer cotidiano em que o indivíduo está imerso, e que constrói e reconstrói incessantemente, despontam vez ou outra alguns nós que revelam particularidades na relação do sujeito com o todo circundante, e ao observá-los podemos identificar as ferramentas (cognitivas, dialógicas ou concretas) que ele cria ou se apropria, na tentativa de entender, explicar, problematizar e propor soluções. E as relações entre as práticas sócio-culturais e a matemática oral ou dialógica, seja dos caboclos ribeirinhos, seja dos feirantes no Ver-O-Peso, seja do lavrador, do pedreiro ou da minha empregada, se evidenciam nesses elementos nodais.
Entretanto, a tese que norteia nossa ação pedagógica deve ser a de que o conhecimento matemático resulta das interlocuções estabelecidas pelo homem com os elementos culturais do contexto no qual é produzido. Quando assumido como linguagem, esse conhecimento torna-se um recurso fundamental no exercício de leitura da realidade, voltado à elaboração de soluções dos problemas cotidianos na caminhada pela melhoria da qualidade de vida. É preciso levar a Matemática da cozinha para a escola.

Referencias
D'AMBROSIO, U. Educação Matemática: da teoria à prática. Campinas: Papirus. 1996.
_____________. Sócio-cultural bases for a Mathematics education. Campinas: Unicamp. 1985.

sábado, 17 de janeiro de 2009

UEPA! Mais um Prêmio DARDOS.

Tati Martins, do "Mulher é desdobrável. Eu sou" honrou o "Este Blog é Minha Rua" com o sétimo prêmio DARDOS que ele recebe. E estamos apenas na segunda semana do ano. Eis, pois, uma maneira "paid'égua" de começar o ano.
Agradeço a ti, Tati (rs). Gosto do seu blog, que tem um excelente conteúdo, e acho seu título original e curioso. Creio que foi emprestado de uma poesia de mesmo título, da Adélia Prado, a qual, por sua vez, se parece com o "Poema das 7 Faces", do Drumond.
Para mim, o título sugere a extraórdinária habilidade das mulheres em se multiplicarem, numa só. Espero que o ano de 2009, que é o ano das mulheres, revele muitas mulheres desdobráveis.

Este blogueiro sente-se, mais uma vez, lisongeado, e só espera que possa continuar fazendo juz as honras recebidas.

quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

ENCERAMENTO DO CURSO NO NTE

Hoje (15 de janeiro de 2009) concluímos o período letivo do Núcleo de Tecnologia Educacional de Belém (SEDUC), e com ele encerramos também mais um curso TECNOLOGIAS NA EDUCAÇÃO: ENSINANDO E APRENDENDO COM AS TIC (100h).
Iniciamos essa modalidade de curso em agosto do ano passado (2008), após participarmos de um encontro do ProInfo Integrado, em Brasilia-DF. Este é, então, o segundo realizado em 2008, tendo iniciado em 03 de novembro de 2008. Com mais este curso, já certificamos cerca de 250 professores, muitos dos quais necessitavam dessa qualificação para assumirem lotação nas Salas de Informática de escolas da rede pública estadual.
E já nos preparamos para começar mais um, o primeiro de 2009, em fevereiro próximo. Inclusive, já começamos a pré-inscrição dos interessados, que pode ser feita no NTE ou por telefone (3276 2223)
Na foto, em pose para a posteridade, os professores-cursistas de minha turma das terças e quintas, diante da mesa preparada carinhosamente por eles para este momento.
Devo dizer que sempre fico muito feliz quando encerro um curso desses, não apenas pelo fato de levar a bom termo mais um trabalho, mas por ter contribuído na formação de formadores, por ter ampliado meu ciclo de amizades e, fundamentalmente, pela esperança que se renova sempre que percebo que algumas sementes que lançamos não caíram sobre pedras.
Essa é a esperança de ver a Escola brasileira melhorando não porque recebeu computadores, mas porque seus alunos e professores, ao fazerem uso pedagógico dessas tecnologias, melhoram a si mesmos. E com isso irão, lentamente e gradualmente, melhorando a escola, a sociedade e o mundo. Um novo mundo é possível, mas somente pela educação de qualidede poderemos alcançá-lo, ou construí-lo.

MAIS DARDOS E UM NEFELIBATA

Este blogueiro sente-se num momento "nefelibatário" (risos), ou seja, estou andando nas nuvens, mas não no sentido depreciativo do termo. Diz-se do nefelibata (gr.nephele=nuvem; batha=que se pode andar) aquele que anda ou vive nas nuvens.
No caso em questão, ando nas nuvems porque ganhei mais um Prêmio DARDOS, desta feita pelas mãos de Conceição, do blog Cultura da Escola, e com esta são 6 indicações. É ou não para se sentir nas nuvens??? Muito obrigado, mesmo.
Na primeira indicação que recebi, fiz o seguinte post:

A Internet aceita tudo que se lhe deite, mas há muitas coisas que me seduzem no mundo digital. As redes sócio-interativas que criamos na Web, por exemplo, é uma delas. Por paradoxal que possa parecer, tenho a impressão que é mais fácil a gente encontrar pessoas que pensam como a gente, e reunir amigos no mundo virtual que no real. Os blogs são um desses nichos comunitários que considero mais "Paid'égua!".
Clique AQUI, para ler a postagem original

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

MEUS INDICADOS AO PRÊMIO DARDOS

Sobre o Prêmio DARDOS...
O Prêmio Dardos é uma deferência entre blogueiros e uma forma singela e muito agradável de divulgar blogs, enquanto estimula e promove a confraternização entre eles.
Como diz minha amiga Josete, do Blog Informática Educativa, "Esse selo foi criado com a intenção de reconhecer os valores que cada blogueiro emprega ao transmitir valores culturais, éticos, literários, pessoais, etc., que em suma, demostram sua criatividade através do pensamento vivo que está e permanece intacto entre suas letras, entre suas palavras.(..) É uma forma de demonstrar carinho e reconhecimento por um trabalho que agregue valores à web."

Por isso quero agradecer "muitissíssimo" as amigas Marli Fiorentini; Celoy Mascarello e Suzana Gutierrez, também ganhadores do DARDOS, ao amigo Adinalzir Lamego e em especial a Marcia Paganella, que foi quem primeiro me deu o Prêmio Dardos, em 15/09/2008.

O premiado deve seguir as seguintes instruções:
* Deve exibir a imagem do selo em seu blog;
* Linkar o blog pelo qual você recebeu a indicação;
* Escolher outros 15 blogs a quem entregar o PRÊMIO DARDOS;
* Avisar os escolhidos.

Correndo o risco de cometer alguma injustiça, porquanto há muitos Blogs que merecem receber tal distinção, divulgo abaixo a minha lista. Tentei indicar alguns blogs que apesar de bons ainda não haviam recebido o prêmio/sêlo. Clique no nome para ver o blog.

Leonor Cordeiro; Sinara Duarte; Robson Freire; Silvana Marmo; Emilia Miranda; Jenny Horta; Claudia Nascimento; Francisco Silva; Marcia Frota; Martoni; Marli Fiorentini; Luis Dhein; Marcio Proença; Biarates; Dani Benaion;

A todos os indicados, aqui e em outros Blogs, minhas sinceras e efusivas congratulações e parabéns cheios de rapapés e salamaleques. E a você, caro amigo(a)leitor(a), muito obrigado pela sua visita.

ANIVERSÁRIO DE BELÉM-393 ANOS

Hoje essa encantadora Nossa Senhora de Belém do Grão-Pará comemora 393 anos. Estamos chegando aos 400 e imagino que festança paid'égua teremos.
Cheguei aqui em 1980, vindo de Nova Iguaçu-RJ, para ser professor no antigo Projeto JARI (as margens do Rio Jari, fronteira com Amapá). Em 1982 vim morar em Belém e ser professor da rede pública e particular. Naquela época a cidade me encantava mais do que hoje, porque não havia outdoors nem as pichações que enfeiam tanto os prédios públicos e particulares.
Mas Belém continua me enchendo de prazer e encanto sempre que eu e Leca apreciamos o por-do-Sol na Baía do Guajará, ou quando caminho solitário por suas ruas sombreadas pelas frondosas mangueiras.
Belém não é somente bonita, ainda que seu povo seja descuidado com seu patrimônio e com a limpeza das ruas, ela é cheirosa e saborosa. Seus aromas, sabores e odores estão no patchouli, na priprioca, no açaí etc. E eu os encontro sempre que tomo uma tijela do açaí bem grosso, gelado, com açúcar e farinha de tapioca; ou quando tomo um tacacá, um sorvete de castanha-do-pará ou coloco um sachê de patchouli no carro.
Costumo dizer para meus alunos que sou mais paraenses que eles, porque ESCOLHI viver aqui, e porque prezo, respeito e preservo a cultura local. Sei que como educador tenho dado minha contribuição para tornar essa cidade melhor, mas isso é o mínimo que posso fazer por um local que me recebeu tão bem e me permite ser feliz.
FELIZ ANIVERSÁRIO, BELÉM!

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

GANHAMOS MAIS UM PRÊMIO DARDOS

Recebi da Professora Celoy Mascarello, multiplicadora do Proinfo no NTE de Xanxerê (SC), uma indicação para o Prêmio DARDOS. Fiquei muito satisfeito ao receber mais uma vez este selo de blogueiros. Para mim, blogueiro não é apenas o que tem blogs, mas o que lê blogs.
Temos vistos diversos concursos para eleger o melhor blog, os quais, muitas das vezes, refletem apenas um processo eleitoral é baseado no número de votos garimpados ferrenhamente pelo candidato; contudo, para mim são essas demonstrações expontâneas e voluntárias que nos honram sobremaneira, nos enchem de prazer e estimulam a prosseguir como blogueiro.
Muito obrigado Celoy, e congratulo a todos os demais indicados. Como é obrigação do contemplado apresentar outros 15 blogs, estarei divulgando meus novos indicados provavelmente amanhã.

terça-feira, 6 de janeiro de 2009

MAYSA: QUANDO FALA O CORAÇÃO

Caro leitor, provavelmente você sabe que nesta segunda-feira, dia 05/01/2009, a Rede Globo estreiou a minisérie Maysa: quando fala o coração, que em 9 capítulos apresenta a conturbada vida da cantora Maysa Matarazzo, até sua morte aos 40 anos em um acidente de carro na ponte Rio-Niterói (1977). Ela realmente deixou falar mais alto a voz do coração.
E se é um apreciador do que chamo de BMB (Boa Música Brasileira)e bom saudosista como eu, com certeza deve estar se deleitando com as belas (e tristes) canções de Maysa, bem como os registros originais que compõem a trilha sonora da minisérie.
É mais um trabalho magistral de Manoel Carlos (autor), de Jayme Monjardin (filho da cantora e diretor da produção) e de Larissa Maciel (atriz que interpreta Maysa).
Acho que a Rede Globo está de parabéns ao fazer o resgate da produção artística de Maysa, enquanto apresenta essa inigualável cantora ao público da nova geração, que não somente não a conheceu como nem sabe o que é "música de fossa" (Fossa: estado ou condição de quem se encontra deprimido, desalentado, triste - Dic. Houaiss). O jovem de hoje pensa que música romântica, ou "música dor de cotovelo", é essa 'melosidade' das duplas breganejas ou dos grupos ditos 'de pagode', cujas letras, com raras excessões, apresentam rimas paupérrimas e melodias pouco criativas.
No blog do meu amigo Martoni, um holandês maluco por Bossa Nova, você pode encontrar uma excelente postagem sobre Maysa (clique AQUI), bem como acessar um excepcional material sonoro sobre a Bossa Nova, do programa de Rádio Forma & Elenco.

Em tempo: Acho que já é hora da nossa televisão (Globo, SBT, Band, Record, Cultura etc) realizar um especial sobre Wilson Simonal, e cumprir com seu papel de ser uma espécie audio-visual de arquivo cultural de nossa sociedade. Estou aguardando por isso faz tempo, e creio que muitos brasileiros também!
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Hoje me bateu uma baita saudade
Eita, saudade!
Saudade é coisa boa com cheiro de velharia. Fala de pessoas ausentes, de vivências passadas e de coisas já experimentadas mas, e fundamentalmente, fala daquilo que não esquecemos. É tatuagem no coração e na mente. E muito embora digam que a saudade é dor pungente, todos que a sentiram sabem que é melhor que dor de dente.

Dizem que a saudade mata a gente, morena, mas creio nisso não. A saudade não nos foi dada para sofrer, foi-nos dada para viver, ou reviver, como queiram; mas também pode servir para fortalecer o coração e alma do "caboco" saudosista.

Somente os sem amor morrem de saudade ou fazem de suas saudades um lugar de castigo. Minhas saudades são como meus álbuns de retrato: dizem da minha história, por isso guardo-as com carinho. E quando eu me for, sei que serei saudade também.

domingo, 4 de janeiro de 2009

A REVOLUÇÃO PELAS REDES DIGITAIS

Caro leitor, seja bem vindo a primeira postagem deste ano de 2009.
Esses últimos dias foram de descanso e lazer para mim, e rogo que para você também. Aproveitei para relaxar com a família na bucólica Ilha do Mosqueiro, (cerca de 1 hora de Belém) e ler um pouco. E é sobre o que li nestes dias que tratarei nesta postagem.

Educação (como formação do indivíduo), Cultura (como tudo aquilo que ele produz), a Economia (como a produção, distribuição, acumulação e consumo de bens e produtos) e Mídia (como meio de comunicar os 3 anteriores) são os fios que tecem a trama do tecido social humano desde que o homem inventou o comércio; mas o modelo de sociedade ainda vigente, que tem nos bens materiais e na propriedade privada seu esteio e paradigma, vê-se as voltas com a mais brutal transformação que essa sociedade mercantilista já passou: a implantação da sociedade digital e da gigantesca rede de produção e compartilhamento de informações.

Além das redes de colaboração: internet, diversidade cultural e tecnologias do poder (Edufba, 2008. 232 p.) é um livro que fala disso. É leitura obrigatória para todo aquele que lida com a Internet como ferramenta de trabalho, seja como fonte de pesquisa e de produção de conhecimento ou como rede de compartilhamento de informações e formadora de opiniões, ou que deseja saber por quem os sinos digitais dobram.

O livro é capitaneado pelos professores por Nelson De Luca Pretto (UFBA) e Sérgio Amadeu da Silveira (Faculdade Casper Líbero), que organizaram a publicação; e traz uma coletânea de 16 artigos de 21 pesquisadores, mais o depoimento do rapper BNegão (compositor e vocalista da banda Planet Hemp) e uma entrevista com professora Léa Fagundes.

A obra oferece rico material para embasar discussões e reflexões sobre a cibercultura, sobre a produção intelectual no ciberespaço, sobre os embates educacionais, sociais, políticos, morais, éticos, artísticos, culturais e econômicos surgidos com o advento das redes digitais P2P e a anarquia saudável que ela gerou e faz crescer, afinal “o conhecimento cresce mais rapidamente quanto mais for compartilhado” (op. cit., p.9). E coerente com essa política, própria dos usuários de software livre, a obra está sob licença Creative Commons para uso não-comercial.

Atuando como formador de professores em Informática na Educação a mais de 10 anos, recomendo essa leitura com entusiasmo.
No TOP BLOG 2011 ficamos entre os 100 melhores da categoria. Pode ser pouco para uns, mas para mim é motivo de orgulho e satisfação.
Sou muito grato a todos que passaram por essa rua que é meu blog e deram seu voto. Cord ad Cord Loquir Tum

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Petição por uma Internet Democrática